terça-feira, 29 de outubro de 2013

Sábado
 
09/11
 
Sala Redenção
 
15:30
 
 
 
O Porteiro da Noite
Il portiere di notte, 1974
De Liliana Cavani

Conheça os Palestrantes


Rafael Rosa Hagemeyer


 

Realizou mestrado na UFPR sobre o imaginário do movimento estudantil brasileiro em 1968 e doutorado na UFRGS sobre a identidade antifascista nas canções da Guerra Civil Espanhola. Foi professor da Universidade Positivo, nas áreas de História da Comunicação, Arte e Estética. Como professor colaborador da UFPR ministrou as disciplinas de História do Brasil e História Moderna e Contemporânea. Realizou pesquisa pós-doutoral na Espanha junto ao Departamento de História da Arte da Universidad Autónoma de Madrid, investigando a iconografia das Guerras de Independência. Atualmente é professor da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) onde coordena o Laboratório de Imagem e Som (LIS). É responsável pela disciplina "História, Narrativas e Registros Audiovisuais" no Programa de Pós-Graduação em História e desenvolve projetos relacionados a Música, Cinema, Arte e Política.

Para acessar seu currículo: http://lattes.cnpq.br/4314056838703673

Nilza Silva

É psicóloga formada na UFRGS e participou como palestrante de diversas edições do ciclos de cinema.

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Em breve!

A Bela do Sábado de Tarde


Charlotte Rampling
Atriz britânica, atuou em diversos filmes marcantes como Vanishing Point, Os deuses malditos, Giordano Bruno, Zardoz, O Veredicto e Coração Satânico. Seu último trabalho foi a série de TV Dexter.







 

Trailer O porteiro da noite


domingo, 20 de outubro de 2013

Sábado, dia 26/10
 
Sala Redenção
 
15:30
 
O Império dos Sentidos
 

 

Conheça os Palestrantes


Luiz Dario Teixeira Ribeiro
 

Luiz Dario Teixeira Ribeiro é Professor de História Contemporânea e História da África na UFRGS. Participa ativamente das atividades da área Cinema-História, estando presente nos ciclos de cinema realizados nos últimos sete anos. Defendeu recentemente a Tese Capítulos sobre a História do século XX.

Para acessar seu currículo: http://lattes.cnpq.br/5889002456637544


 
 
 
 
 
 
Amadeu de Oliveira Weinmann


Professor do Departamento de Psicanálise e Psicopatologia do Instituto de Psicologia/UFRGS. Coordenador do Núcleo de Pesquisa em Psicanálise e Cinema (NUPPCINE).

Para acessar seu currículo: http://lattes.cnpq.br/9624749855903162

Texto

Em breve!!!

A Bela do Sábado de Tarde

A Bela do Sábado de Tarde
 
Eiko Matsuda
Atriz japonesa, iniciou a carreira com O império dos sentidos
 


 

Trailer O império dos sentidos


domingo, 13 de outubro de 2013

Intermezzo

Camaradas:
inauguramos a seção Intermezzo, onde abordaremos a sexualidade em outras plataformas.



UM CURTO INTERMEZZO:
SEXO NO MUNDO DOS GAMES

Christopher Kastensmidt

Professor da Uniritter, Escritor, especialista em narrativas digitais, jogos digitais e literatura fantástica.


Assistir filmes sensuais? Pode dar tesão. O cinema mexe com os nossos sentidos, que são fundamentais para a nossa sexualidade. Ler um livro erótico? Podemos ver, pelos setenta milhões de cópias vendidas de Cinquenta Tons de Cinza, que ele certamente tem seu lugar. O livro toca na imaginação: a zona erógena mais poderosa do corpo.

Então qual seria o lugar dos games no mundo de erotismo? Quando o assunto se trata de sexo, os games oferecem seu velho curinga de sempre: a interatividade. Os games, que movimentam quase setenta bilhões de dólares por ano, já invadiram quase todo cotidiano das nossas vidas, e é a interatividade que faz o jogo digital tão poderoso em áreas tão diversas, como entretenimento, educação, treinamento, propaganda e arte. A interatividade é a diferença entre ler sobre o Christian Grey e SER o Christian Grey. No game, temos o poder de interpretar o papel do protagonista e determinar suas ações.

No Japão, lugar sem os mesmos tabus sexuais do ocidente, a indústria de games eróticos é desenvolvida e gigante. Empresas conhecidas no ocidente por seus jogos infantis, como a Square Enix, nunca tiveram problema nenhum em lançar games eróticos no seu país de origem. O gênero de games eróticos é tão grande que tem nome próprio: eroge.

Porém, essa é uma história à parte. No mundo ocidental, a sexualidade nos games evoluiu de forma diferente. Nas primeiras tentativas de inserir conteúdo sexual dentro dos games, como Beat ‘Em & Eat ‘Em (Atari 2600, 1982) e Stroker (Commodore 64, 1983), os desenvolvedores colocaram atos sexuais em forma de jogos de ação. Estes games vão do infantil ao nojento, e a grande maioria das lojas recusou vender este conteúdo questionável. Fiquem avisados os curiosos que pensam em fazer uma busca Google sobre estes dois títulos.

Logo, porém, o assunto de sexualidade começou a ser tratado de forma mais séria. O popular Defender of the Crown (Commodore Amiga, 1986) em vez de simular o ato sexual, colocou o sexo dentro do contexto do game, o que o tornou mais aceitável e sutil para o varejo e o consumidor.



Defender of the Crown

O lançamento do game Leisure Suit Larry in the Land of the Lounge Lizards (PC DOS/Apple II, 1987) foi uma das grandes marcas de sexualidade em games. Al Lowe, game designer da empresa On-line Systems (que mais tarde virou a famosa Sierra On-Line), teve a ideia de criar uma aventura gráfica para adultos. O jogo, muito bem humorado, segue Larry Laffer, homem brega de 38 anos, na sua busca de perder a virgindade.



 

Leisure Suit Larry

O jogo popular gerou várias continuações e uma série de remakes que continua até hoje, com uma campanha de financiamento coletivo em 2012 que arrecadou quase setecentos mil dólares.

A partir dos anos 1980, abriram-se as portas para tratar de assuntos adultos em games. Porém, ainda faltava amadurecimento nas suas abordagens.

Em uma indústria que, durante muito tempo, foi dominada pelos homens, podemos observar a predominância de fantasias masculinas. Esta, porém, não era característica exclusiva dos games eróticos. Durante o século XX, a maioria de games se baseou em fantasias masculinas, por exemplo: matar um dragão, ganhar a Copa do Mundo ou lutar na Segunda Guerra Mundial.

Essa influência masculina se refletiu no tratamento de sexualidade, muitas vezes abordada de forma infantil, desde os tarados de Tomb Raider que criaram modificações topless de Lara Croft para todos os jogos da série, até os próprios criadores do game BMX XXX (Xbox/PlayStation 2/GameCube, 2002), que introduziram mulheres peladas andando de bicicleta e cenas de strippers.



BMX XXX

A famosa polêmica sobre a modificação Hot Coffee (“café quente”) do game Grand Theft Auto: em San Andreas (PlayStation 2, Xbox, Microsoft Windows, 2004) foi emblemática a abordagem nenhum um pouco séria da sexualidade. Neste caso, a equipe de desenvolvimento escondeu um minigame de sexo dentro do conteúdo do disco, sem avisar as autoridades que designam a classificação do game. Desta brincadeira surgiram processos jurídicos e ações políticas que forçaram a indústria mundial a reestruturar seus sistemas de classificação etária.

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Modificação Hot Coffee do game Grand Theft Auto: San Andreas

Felizmente, podemos citar um amadurecimento notável da indústria no século XXI. O game The Sims (Windows/Macintosh, 2001), talvez o primeiro grande sucesso da indústria com uma maioria de jogadores femininos, introduziu relacionamentos entre pessoas do mesmo sexo. O RPG Fable (Xbox, 2004) permitia casamentos e sexo entre pessoas de qualquer gênero, porém sem uma representação gráfica (apenas com áudio).

Hoje, sexo e sexualidade são comuns nos games, mas, em alguns casos, a objetivação da mulher persiste. Temos que navegar por clubes do striptease em Hitman Absolution (Xbox 360/PlayStation 3, 2012) e um bordel em Dishonored (PlayStation 3/Xbox 360, 2012). O jogo The Witcher (Windows, 2007) oferece uma carta para cada mulher conquistada. O Kratos pausa suas batalhas sangrentas para cenas de sexo em todos os títulos da série God of War. A fantasia masculina do sexo gratuito continua aparecendo, e em games altamente populares, causando um grande debate dentro da indústria.

Por outro lado, podemos citar vários exemplos opostos. Muitos games estão oferecendo um tratamento mais sério ao sexo, colocando-o dentro do contexto da história e dando uma chance para jogadores, de ambos os sexos, a encarar a sexualidade da maneira que eles mesmos escolhem. Na série Mass Effect, o jogador pode interpretar um homem ou uma mulher, homossexual ou heterossexual, a até pode ter relacionamentos sexuais extraterrestriais (sexo com alienígenas, alguém?).





Mass Effect – para todos os gostos

Fahrenheit (PlayStation 2/Xbox, 2005) e Heavy Rain (PlayStation 3, 2010) são outros títulos onde o sexo é baseado em relacionamentos e não em conquistas.



Fahrenheit



Heavy Rain

A indústria ainda tem um longo caminho a trilhar para amadurecer seu tratamento do sexo ao ponto de alcançar as artes mais antigas, porém o progresso da última década foi fenomenal, e o futuro da chamada “décima arte” parece bastante titilante.

domingo, 6 de outubro de 2013

Sábado, dia 19/10
 
Inglaterra Vitoriana, vitoriosa e conservadora
 
Drácula de Bram Stocker
De Francis Ford Coppola
 
 
 
Sala Redenção
15:30

Conheça os Palestrantes


Cesar Augusto Barcellos Guazzelli
 

CESAR AUGUSTO BARCELLOS GUAZZELLI É LICENCIADO E MESTRE EM HISTÓRIA PELA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL, E DOUTOR EM HISTORIA SOCIAL PELA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO. ATUA COMO PROFESSOR ASSOCIADO NÍVEL QUATRO DO DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA, PROFESSOR PERMANENTE DO PPG EM HISTÓRIA E DO PPG EM RELAÇÕES INTERNACIONAIS DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL. ÁREAS DE ATUAÇÃO: TEORIA E METODOLOGIA DA HISTÓRIA, HISTORIA DA AMÉRICA E HISTÓRIA DO RIO GRANDE DO SUL, COM ÊNFASE NAS FRONTEIRAS DURANTE O SÉCULO DEZENOVE. CRIADOR DA ÁREA DE HISTÓRIA DO FUTEBOL. FUNDADOR E PARTICIPANTE DO DO GT "FRONTEIRAS AMERICANAS" DA ANPUH. PÓS-DOUTORADO NA UNIVERSIDADE NACIONAL DE GENERAL SARMIENTO.

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Nikelen Acosta Witter
 

Possui graduação em História pela Universidade Federal de Santa Maria (1997), mestrado em História pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (1999) e doutorado em História pela Universidade Federal Fluminense (2007). Atualmente é professora do Centro Universitário Franciscano - UNIFRA (Santa Maria, RS). Tem experiência na área de História Contemporânea, com ênfase no século XIX. Suas pesquisas de mestrado e doutorado centraram-se em História da Saúde e das Práticas de Cura. Atualmente, ainda trabalhando no campo da história cultural, dedica-se a investigações sobre História da Leitura. Ministra, ainda, cursos sobre História da Alimentação, História do Vestuário e questões que envolvam Gênero e a História das Mulheres.

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AS VAMPIRAS DO CASTELO DE DRÁCULA


AS VAMPIRAS DO CASTELO DE DRÁCULA: UM ESTUDO DE GÊNERO

Duda Falcão

Escritor e Professor de História

Na década de 60 do século passado, havia um forte engajamento político que buscava se libertar da opressão de uma sociedade em que a hegemonia política, social e cultural era privilégio usufruído, em sua esmagadora maioria, pelos homens. Para isso se fazia necessário construir uma história em que as mulheres fossem não apenas meras coadjuvantes e, sim, participassem ativamente da história, ocupando o papel de protagonistas. Segundo Joan Scott, naquela década “as feministas reivindicavam uma história que estabelecesse heroínas, prova da atuação das mulheres, e também explicações sobre a opressão e inspiração para a ação”. Nesse sentido, as mulheres seriam heroínas capazes de alterar, modificar e reescrever a história por meio de suas ações.

Durante a década de 70, de acordo com Scott, “a história das mulheres afastou-se da política”, de maneira que ampliou “o seu campo de questionamentos, documentando todos os aspectos da vida das mulheres no passado (...)”. Constitui-se, assim, uma nova maneira de se pensar e analisar o papel da mulher durante a história.

Somente nos anos 80 a história das mulheres rompeu definitivamente com a política, rumou para um campo próprio e passou a utilizar o termo gênero com aparente neutralidade. Segundo Scott, houve nesse processo uma mudança na forma de se contar a história das mulheres desde o ativismo feminista. Tal mudança foi alcançada pela utilização do termo gênero como ferramenta mais apropriada para analisar a história da mulher, mais objetiva, mais integradora e alicerçada na legitimidade acadêmica.

As identidades sexuais se constroem de maneira diversa, nas diferentes culturas e em períodos históricos distintos. Porém, é fato que se constituem juntas, em maior ou menor medida, em qualquer sociedade. Não se encontrará sentido em uma leitura de gênero se os papéis de homens e mulheres não forem contrapostos ou justapostos.

Diante de um processo dinâmico e constante, conforme Guacira Lopes Louro, as práticas masculinizantes e feminizantes formam identidades aprendidas, formatadas, reguladas, estereotipadas, incluídas e excluídas das instituições sociais. O livro, tal qual uma instituição, também carrega valores generificados. Na literatura de Bram Stoker, especificamente em Drácula, pretendo analisar algumas relações sociais de gênero, que ajudem a pensar como era vista a mulher e o homem na Inglaterra do século XIX.
 
 

 

Bram Stoker, quando escreve Drácula, utiliza uma fórmula de sucesso que se consagra com o romantismo: seus personagens escrevem diários, cartas, gravam relatos e também leem reportagens de jornais. Com essa técnica de escrita, o autor arquiteta uma atmosfera de realidade para aquilo que faz parte de um universo, além de ficcional, sobrenatural. O leitor tem a sensação de que está em contato com o “real”.

É para a Transilvânia, no início da narrativa, que viaja Jonathan Harker. Território no centro-norte da Romênia, no lado oriental europeu. Um lugar de natureza selvagem, bela e desconhecida. Harker, ao entrar no trem que o levará a esse destino, escreve em seu diário:

“Tive então a impressão que o Ocidente ficara para trás e que agora entrávamos no Oriente. (...) Em nenhuma das obras e mapas consultados me foi possível estabelecer a exata localização do Castelo de Drácula (...). li alhures a afirmação de que todas as superstições existentes neste mundo se originam do arco formado pelos Cárpatos, como se convergissem todos os vórtices das mais férteis imaginações.”

O Oriente é tido por Harker, um corretor de imóveis, como o lugar do desconhecido, do estranho, do sobrenatural, do supersticioso e do bárbaro. Ele descreve os homens e mulheres que encontra em sua viagem até o castelo:

 

“As mulheres em geral eram graciosas, exceto quando observadas de perto. Tinham a cintura deselegante e muito volumosas. (...) As figuras étnicas mais estranhas eram representadas pelos eslovacos, que formavam um aglomerado de aspecto muito mais bárbaro (...) aparentemente nada afáveis. Vistos sobre um palco, seriam imediatamente identificados no papel de um bando de antigos salteadores orientais. No entanto, como vim a saber em seguida, trata-se de gente de hábitos acentuadamente pacatos e talvez carente de uma mais natural autoafirmação.”.

 

As mulheres do povo foram pouco descritas por Harker, quando vistas de perto não agradaram seu gosto estético pelo aspecto de deselegância dos corpos volumosos. Para serem belas, talvez devessem apresentar cinturas mais delicadas e delgadas, o que surtiria no personagem um sentimento de graciosidade. Quanto aos homens, Jonathan Harker os identificou com aspecto bárbaro, como se fossem ladrões de estrada. Faltava uma natural-afirmação aos pacatos moradores da Romênia. Percebe-se que Jonathan, um viajante inglês, durante a caracterização que faz dessas pessoas demonstra valores e ideais da sua própria cultura, uma cultura ocidental, racional, produto do iluminismo, da revolução industrial e centrada na superioridade do homem sobre a mulher, do inglês branco sobre outras etnias.

Nesse estágio da narrativa, Jonathan Harker ainda não sabe, mas enviará para Londres o conde Drácula, um vampiro maligno, uma infecção, um flagelo. Londres, uma das grandes capitais da Europa, participante do projeto das luzes, território Ocidental rumo à higienização, à escolarização, à normalização, à libertação de doenças e de calamidades. O outro, o mal, vem do Oriente para infestar, corromper e desordenar.

Sobre o outro e a identidade, Guacira Lopes Louro constata que:

 

“A afirmação da identidade implica sempre a demarcação e a negação do seu oposto, que é constituído como sua diferença. Esseoutro’ permanece, contudo, indispensável. A identidade negada é constitutiva do sujeito, fornece-lhe o limite e a coerência e, ao mesmo tempo, assombra-o com a instabilidade.”

 

Sem dúvida, Jonathan Harker é assombrado pela visão do novo, aquilo que lhe é estranho, diferente de sua maneira de se postar no cotidiano. Depois de observar e interagir com os indivíduos daquela terra selvagem, o protagonista chega ao castelo. É nesse ambiente medieval caracterizado pelo sobrenatural, o castelo em ruínas e repleto de sombras, que Stoker fará com que Jonathan conheça o próprio conde Drácula e as suas três amantes vampiras.

Drácula é descrito com olhos dotados de um intenso brilho, a boca de um aspecto cruel, lábios extremamente vermelhos, dentes muito afiados de uma brancura de marfim, bigode e barba, face aquilina, arcada nasal bastante fina, orelhas pontiagudas na parte superior, mandíbula larga e forte, mãos brancas com uma tenaz de aço, aspecto tosco e pesado, extremidades dos dedos achatadas e deformadas, tufos pilosos no centro da palma, unhas longas e pontiagudas, mau hálito e extraordinária palidez.

As três vampiras eram jovens, damas do mais fino trato. Elas possuíam dentes de um branco fulgurante que se assemelhava a pérola, lábios rubros e voluptuosos dos quais Harker compulsoriamente implorou beijos, risada argentina e musical de intolerável percussão. Duas delas tinham tez escura, nariz aquilino, olhos grandes e matizados de vermelho. A terceira era de rara beleza, de acordo com Harker “o que de mais belo possa se imaginar”, cabelos longos e dourados, lindos olhos de tom safira. Hálito doce e cálido, boca que “ressumava um sabor amargo, um gosto acre, que tresandava a sangue”, e nos olhos desvairada voluptuosidade.

Segundo Guacira Lopes Louro “ as práticas discursivas fazem com que aspectos dos corpos se convertam em definidores de gênero e de sexualidade e, como consequência, acabem por se converter em definidores dos sujeitos”. A partir da narrativa de Stoker é possível averiguar as diferenças entre Drácula e as vampiras. A boca de Drácula tem um aspecto cruel, enquanto a das vampiras é rubra e voluptuosa, indicando um caráter de sedução do qual Harker não escapa. Drácula tem na mão uma tenaz de aço, atributo de força. Possui mau hálito, mãos asquerosas e unhas pontiagudas. Sua descrição beira o limite entre o humano e o monstruoso. Drácula é forte, asqueroso e cruel. As vampiras, belas, sedutoras e perigosas.

Stoker escreveu Drácula, no século XIX. Inserido nesse contexto cultural e histórico, os personagens que ele criou correspondiam a modelos desejados e a modelos que a sociedade civilizada deveria combater. As vampiras do castelo possuíam uma sexualidade perigosa de “desvairada voluptuosidadeque não correspondia ao papel de uma mulher decente, capaz de cuidar do homem e educar os filhos dentro de preceitos da moral e dos bons costumes da época.

Em relação a discursos da moral, da lei e da igreja para disciplinar a sexualidade, é interessante essa observação de Andrezza Rodrigues sobre o que marca o sexo no século XIX:

 

“é justamente o fato de se falar sobre ele como em nenhum outro século; o sexo foi estudado e medido e produziu-se uma literatura do sexo correto, medicalizado. Cria-se em seu entorno uma biologia da reprodução, esta caindo para um campo de outros poderes vindouros, como o medo do mal venéreo e deste para a higiene.”

 

A literatura, além de um prazer, um passatempo ou diversão, dependendo é claro de quem , promoveria também a moralização da sociedade. Um livro de horror, repleto desses discursos, através do medo, do grotesco, do impuro, da imundície e do bizarro, seria capaz de barrar, tolher e coibir, ao menos em parte, ações que não correspondessem à moral vigente.

Antes que Harker seja consumido pela sede de sangue das três vampiras, Drácula intervém com violência. Para conter o ímpeto selvagem de suas concubinas dá a elas um presente. Essa passagem é descrita no Diário de Jonathan assim:

 

“(...) um saco que fora lançado sobre o assoalho e dentro do qual algo se debatia, como se nele ocultasse alguma coisa viva. (...) Uma das mulheres se adiantou e abriu o pequeno fardo. Se meus ouvidos não me enganaram, percebi vindo de um débil suspiro, acompanhado de um gemido, como se se tratasse de uma criança semiasfixiada. Num instante, as três mulheres formaram uma roda, enquanto eu estremecia de horror”.

 

Considero essa cena uma pista muito interessante para a própria origem do mito do vampiro. Decorre de um passado remoto, do nascimento das primeiras civilizações, mais precisamente no Crescente Fértil. Três demônios femininos podem estar conectados a essa origem: Lamastu, demônio acadiano, responsável pelas doenças infantis; Lilitu, demônio da babilônia, representante da noite; e Lilith. Lilith corresponde a duas tradições, à popular judaica, do Antigo Testamento, e à do Talmude. Na primeira, é conhecida como a noturna e considerada um fantasma sugador de sangue. Na segunda, é vista como um ser maligno e a primeira mulher de Adão. Seu animal sagrado é a coruja.

Agrupando algumas características importantes das três figuras temos: a ligação com a coruja, a noite, a propriedade de disseminar doenças infantis e sugar sangue. A mulher, na antiguidade, seria vista como a responsável pela vida dos recém-nascidos e das crianças. Quando a morte de uma criança ocorria, um demônio feminino era o causador. Essa explicação diminui a responsabilidade de uma mãe, até mesmo de um pai, mas continua sendo a mulher a fonte da culpa. As mulheres, nesse contexto, também estão associadas à noite, naquilo que é a inversão do dia, e à falta dos bons valores. As vampiras do castelo são uma representação desse estigma, desse mal, dessa corrupção.

As lâmias da antiga Grécia parecem ter herdado alguns desses elementos: raptavam crianças e sugavam seu sangue. Possuíam um corpo horrível, a metade superior mulher e a metade inferior serpente, um ser híbrido. Outros relatos dizem que elas adquiriram o poder de se transformar em belas mulheres e passaram a seduzir homens jovens. Ou seja, seduzir homens jovens e beber o sangue de crianças foi exatamente o papel atribuído às concubinas de Drácula.

A cultura em torno desses três demônios femininos se alastra pela Grécia e pela Roma antiga. Com o passar do tempo, na Europa Medieval e Moderna, outros seres bizarros criados pela imaginação popular vão delineando o que viria a ser o vampiro moderno, tipo de personagem consagrado por Bram Stoker.

Jonathan Harker continua seu relato, depois de ter sobrevivido àquele encontro: “seria o meu próprio corpo lugubremente banqueteado, num festim bem semelhante, pelas três fúrias, também ávidas de sangue”. Stoker invoca ao texto a figura das fúrias, personagens mitológicas que em Roma, segundo o pesquisador Manfred Lurker eram nomeadas assim:

 

“Alecto (a impiedosa), Tisífone (a que vinga os assassinatos), e Megera (a invejosa). Com suas cabeças adornadas por serpentes, manipulando tochas ameaçadoras, levantavam-se do mundo inferior para perseguir todos os pecadores (...). Em Roma eram conhecidas como Furiae (loucas)”.

 

Loucas, invejosas, vingativas e impiedosas, assim eram as Furiae. As vampiras do castelo, assim como outras mulheres monstruosas ou demoníacas da mitologia, carregam em si todo o mal, todo o pecado. Suas características de gênero são construídas a partir da cultura e da história, através do tempo e dos diferentes espaços geográficos.

Em Drácula, mulheres e homens da Inglaterra vitoriana se veem diante de um mal terrível e monstruoso, o outro, criatura desconhecida e ameaçadora que vem do Oriente para infectar o Ocidente cristão, branco, racional e patriarcal. Essa é uma obra que deve frequentar a cabeceira daqueles que apreciam uma boa leitura. E, também, daqueles que gostam de investigar o cotidiano de uma época, suas representações e relacionamentos de gênero.
Sugestões de Leitura

BURKE, Peter (org). A escrita da história: novas perspectivas. SCOTT, Joan. História das mulheres. São Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista, 1992.

LOURO, Guacira Lopes. Gênero, História e Educação: construção e desconstrução. Educação e Realidade, Porto Alegre, v. 20, n.2, jul./dez. 1995, p. 101-132.

_______ Um corpo estranho – ensaios sobre a sexualidade e teoria queer. Belo Horizonte: Autêntica, 2004.

LECOUTEX, Claude. História dos vampiros: autópsia de um mito. São Paulo: Editora UNESP, 2005.

LURKER, Manfred. Dicionário de deuses e demônios. São Paulo: Martins Fontes, 1993.

MELTON, J. Gordon. O livro dos vampiros: a enciclopédia dos mortos-vivos. São Paulo: Makron Books, 1995.

RODRIGUES. Andrezza Christina Ferreira. Drácula, um vampiro vitoriano: O Discurso Moderno no Romance de Bram Stoker. Texto integrante dos Anais do XIX Encontro Regional de História: Poder, Violência e Exclusão. ANPUH/SP – USP. 08 a 12 de setembro de 2008.

STOKER, Bram. Drácula. São Paulo: Círculo do Livro, 1988.